País é o que mais desperdiça aula com bronca

Por Pollyana Nascimento. Em 23/06/09 03:53. Atualizada em 24/01/12 08:26.
Docentes de escolas no Brasil gastam 18% do tempo das classes para manter disciplina; pesquisa abrangeu 23 países

Os professores brasileiros săo os que mais desperdiçam com outras atividades o tempo que deveria ser dedicado ao ensino. No período em que deveriam estar dando aula, eles cumprem tarefas administrativas (como lista de chamada e reuniőes) ou tentam manter a disciplina em sala de aula (em consequęncia do mau comportamento dos alunos). A conclusăo é de um dos mais detalhados estudos comparativos sobre as condiçőes de trabalho de professores de 5Ş a 8Ş séries de 23 países, divulgado ontem pela OCDE (Organizaçăo para a Cooperaçăo e Desenvolvimento Econômico). A pesquisa foi feita em 2007 e 2008.

O resultado năo surpreendeu Roberto de Leăo, presidente da Confederaçăo Nacional de Trabalhadores em Educaçăo. "Năo li a pesquisa, mas é fato que muito do tempo do professor é roubado por tarefas que năo deveriam ser dele. Ele precisa muitas vezes fazer a funçăo de psicólogo, pai ou assistente social, já que todos os problemas sociais acabam convergindo para a escola." Mozart Neves Ramos, presidente-executivo do movimento Todos Pela Educaçăo, conta que, quando foi secretário de Educaçăo em Pernambuco, vivenciou isso na prática.

"Fizemos uma pesquisa com o Banco Mundial que mostrou que boa parte do tempo do professor era para resolver questőes que deveriam ser de responsabilidade de outros profissionais. Mas também detectamos que se perdia tempo com o professor falando de outros assuntos, em vez de tratar do conteúdo daquela disciplina." O relatório da OCDE mostra que a maioria (71%, maior percentual registrado) dos professores brasileiros começou a dar aulas sem ter passado por um processo de adaptaçăo ou monitoria. A média dos países nesse quesito é de 25%.

Os brasileiros também săo dos que mais afirmam (84%) que gostariam de participar de cursos de desenvolvimento profissional. Esse percentual só é maior no México (85%). As informaçőes foram colhidas em questionários respondidos por diretores e professores de escolas (públicas e privadas) selecionadas por amostra. No Brasil, 5.687 professores responderam ao questionário, aplicado em 2007 e 2008. Leăo e Ramos concordam com o diagnóstico de que poucos professores passam por um processo de adaptaçăo. "Muitas vezes, o secretário tem que preencher logo as vagas após um concurso para năo deixar alunos sem aula. É como trocar o pneu do carro em movimento, quando o ideal seria ter um tempo para preparar melhor o profissional que começará a dar aulas", diz Ramos. Esse problema se agrava com a constataçăo na pesquisa de que os professores brasileiros trabalham com turmas com número de alunos (32) acima da média (24). Apenas no México, na Malásia e na Coreia do Sul essa relaçăo é maior. Eles também tęm menos experięncia em sala de aula do que a média -só 19% dăo aula há mais de 20 anos; a média de todas as naçőes comparadas é 36%. Estăo abaixo da média (89,6%) ainda no nível de satisfaçăo com o trabalho: 84,7%, o quarto menor índice.

Diretores: A pesquisa investigou a visăo dos diretores sobre problemas que afetam o aprendizado. O Brasil fica acima da média em questőes como absenteísmo de docentes, atrasos e falta de formaçăo pedagógica adequada. Também foram listados problemas relacionados a alunos, como vandalismo, agressőes ou trapaças no momento da prova. A indisciplina se mostrou um problema mundial. Na média dos países, 60% dos diretores afirmaram ter, em alguma medida, distúrbios em sala de aula provocados pelo problema. O México tem o maior percentual (72%); o Brasil tem exatamente o índice da média. Diretores brasileiros foram dos que mais relataram ter pouca ou nenhuma autonomia para contratar, demitir ou promover professores por seu desempenho em sala de aula. No Brasil, só 27% disseram que podem escolher os professores. A média dos países é de 68%.

Fonte: Jornal da CiÊncia